quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Apenas uma folha



Ao saudoso Romeu Dale.


Por que o outono parece tão cinzento ao meu olhar? A soma de sentimentos vazios de sentido e de esperança penetra-me os ossos fazendo com que todo meu pobre e limitado corpo sofra de calafrios e daquela lembrança triste de finitude.
Não conseguiria caminhar sorridente como outrora, pois a estranheza em vivenciar passagens distantes de uma alegria velha me levaria ao desespero da busca infundada pela verdade perdida; aquela mesma verdade que passou e se transformou com o passar dos anos e outonos.
A vida persiste em brincar de palhaço, tentando transpor em felicidade o que só é tragédia e estranheza, esvaindo-se como as folhas que caem no meu jardim. Ela não cessa de encenar a sede de totalidade, e a zombaria de ser maior frente à minha inutilidade.
Falta-me força para entoar uma canção da pátria distante ou para declamar o poema há muito preparado para a amada, que de tanto brincar com o mistério foi por ele absorvida. Porventura resta-me algo? Serei eu um triste pajem que luta contra sua vontade de enlouquecer e de se dar por aniquilado?
No afã de responder a tudo e a todos, quedei-me excluído e odiado; solitário sem alma e sonhos enganadores, assistindo ao fracasso de projetos enfadonhos, de gente cuja virtude é o retrocesso e a falsidade. Perplexo, avisto pessoas que resumem suas vidas num desejo imbecil de se esquecer da realidade que sufoca e silencia.
Mergulhado na indiferença, experimento atônito uma beleza que me leva às lagrimas. Choro como criança perdida, consciente de que o mundo não me consolará. Porém poderei, embalado pelas folhas de outono, sentir o vento que inquieta e aquece (mesmo sendo ar gelado) os mais recônditos impulsos.
Já nem posso andar direito, porém a morte já se aproxima, sinto-a. Vem acompanhada dos mais estonteantes delírios, que farão meu ser se sentir livre ou perdido no nada. Quero encontrar algo que me explique ou que ao menos me console desta árdua tarefa de contemplar o obscuro e ainda chorar como se o desnudar da árvore fosse o mais belo espetáculo do mundo (dos mortos?!).
A folha cai, a gota desaba na pia velha, o vento passeia distante, a madeira range harmoniosa, a respiração se esvai aos poucos, a vista começa a fraquejar e perceber apenas o cinza sinal de adeus, o peito se enfraquece, a razão vai se tornando débil e ao mesmo tempo reveladora de um fim que magicamente remete ao começo no primeiro pranto do nascimento. Choro agora, não para anunciar minha imperiosa chegada, mas sim para sussurrar meu tímido e apaixonado fim.

Um comentário:

  1. Olá! Muito legal o seu blog, vc escreve muito bem! Gostei muito desse texto.

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